9.12.07

De não conhecer

Depois que a gente passa do jardim de infância, as primeiras séries, conhecer pessoas passa a ser um ato mecânico do convívio social. Não se desenvolve amizade, se desenvolve relação de existência. Meu pai me dizia que as melhores amizades se desenvolvem na faculdade; as minhas foram no ensino médio e superior. A maioria delas.
Mas a partir do momento que houve a conexão e a amizade surgiu, começou o conhecimento do outro: as conversas para definir territótio, gostos, afinidades. E neste momento, se a pessoa brilha, tudo é sempre interessante. Queria poder ter parado aí.
Tenho amigos fenomenais, e não é um exagero. São pessoas realmente fantásticas, pessoas que eu queria ser se pudesse nascer de novo, pessoas que me complementam e pessoas que olho como objetivo maior de vida.
Contudo, a pureza e ignorância do pouco conhecer é sempre belo. A idéia que se projeta, a impressão que fica daquele ser que se mal conhece, que se quer mais conhecer e parece tão certo naquelo momento, se perde quando se humaniza. O contexto estraga tudo.
A pessoa se encaixa na sua vida, tem perspectivas, necessita de trocas, exige carinho...
Eu sinto falta daquele amigo que eu conheci e não conhecia, das piadas novas, do sorriso constante, da necessidade de se estar junto para descobrir cada vez mais.
Citar Saint-Exupéry é por demais clichê? Miss Brasil?
Eu me torno responsável por aquele que cativo?
Sempre.
Mas se não houvesse cativado, se não tivesse se relacionado, não haveria amigo para se ter.
Não reclamo dos meus.
Só sinto falta das primeiras horas, aquelas que são tão límpidas, tão ausentes de cobranças, tão puras e empolgantes.
Mas roubamos as pessoas para nós mesmos. E as quero.
Momentos, no entanto, aparecem nos quais só queria dizer "Prazer em te conhecer, como você se chama mesmo?"

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22.1.07

Brasil. Ame ou ao menos respeite-o

Estava a ler o Folhateen, fascículo da Folha de São Paulo de hoje (22/01/2007) por puro hábito de ler o jornal todo. Quando mais nova, era o primeiro caderno a ser aberto (se não o único); lembro-me de quando mudou de formato, lia de cabo a rabo. Hoje em dia dou uma olhada, passo rapidamente pela desprezível coluna do Álvaro Pereira Júnior e sigo para o próximo caderno.

Lá estava a matéria de como os adolescentes odeiam a música nacional. Às vezes não somente a música como a cultura e tudo o mais que possa estar interligado ao país. Tinha, naturalmente, a opinião oposta e supostamente embasada de um sociólogo.

Fiquei irritada. Não somente com os adolescentes, mas mais pelo fato de que conheço pessoas adultas que não respeitam a música nacional. Fiquemos na questão musical porque se formos analisar a cultura perderei minha linha e passarei a xingar infinitamente.

Música é algo essencial para quem vós fala e creio que é uma informação que deva sempre ser acrescentada, modificada, variada, constantemente. Quando adolescente não gostava de nada nacional de MPB, definitivamente. Mas flertava com a poesia do Chico Buarque. Adorava minhas bandas americanas e com elas cresci e expandi meu gosto e várias delas ainda ouço. Mas a gente cresce e precisa aprender a conhecer outras coisas, a saber enxergar o que é bom, mesmo não sendo o tipo de música que mais se adora.

É preciso saber que samba é bom e reflete uma cultura incrível. Não precisa gostar.

É preciso saber que Chico Buarque escreve bem demais e que suas músicas representam muito de história e sim, são tocantes enquanto melodia.

É preciso saber que esse país produz muita coisa decente diferente das pelas quais algumas pessoas o associam.

Não creio que seja necessário gostar, mas saber sua importância; não é preciso ler profundamente Marx para saber de sua importância na análise histórica. Não é preciso ouvir constantemente Bach para saber o quão grande era. Não é preciso ler todos os heterônimos de Pessoa para saber que ele era um gênio.

Mas é preciso que se saiba que esse país produz muita coisa boa. Respeitável. Embasada. Que possa se sentir orgulhoso disso.

Não é a feijoada, o sambão, o futebol. Convenhamos, tem cultura quem quer. E, para mim, quem nega o que é bom porque acha que é ridículo, sem ao menos se questionar ou conhecer, é ignorante.

E ignorante não precisa de cultura. Precisa ser ignorado. Porque aprender o que é bom nunca tem tempo. Negar o que é bom por esporte, que vá gostar do acha que conhece.

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18.1.07

Da organização ou da percepção do velho

Ando com muito tempo livre. E como se fosse um ritual que sempre toma conta de mim seja por loucura ou por renovação, resolvi arrumar o quarto.

Não somente arrumar, mas organizar, limpar e me livrar de tudo aquilo que acho que não preciso mais. Fiquei impressionada comigo mesma. Percebi que me apego à muitas coisas e ao me deparar com todas elas me perdia em pensamentos questionando o porque da presença daquele objeto ali. Ainda.

Tanto que demorei quatro dias para separar tudo o que não queria mais junto à mim, juntando pó, ocupando espaço, ocupando pedaços de mim que eu percebi precisarem respirar.

Primeiramente limpei o campo de batalha: rearranjei cama, estante, retirei um sofá que só servia de cesto de roupa suja e tirei tudo o que não tinha função ou tinha a função secundária de juntar mais bagunça.

Comecei então com as roupas. Me despedi delas como lembranças, vestígios de dias mais magros, mais novos, mais sem bom gosto. Separei aquela compra impulsiva que sempre achei ser imune e coloquei em uma sacola. Coloquei muita coisa nesta sacola. Não havia motivo para estarem lá e pilhas se formaram. Chamei uma amiga que se achou em um brechó. Todo o resto, que não foi do gosto dela, e que já não é mais do meu, será doado.

Fui depois para a papelada. Um montante impressionante de papel desnecessário. E olhei um a um, tentando não me sabotar jogando algum telefone importante fora. Ou alguma senha. Faço muito isso. Juntei um saco de sanito preto de papel. E de revistas que não me dizem mais muita coisa (as que dizem estão guardadas, todas juntinhas, separadas por tópicos). E uma caixa enorme de livros didáticos que ganhei pra estudar pro vestibular – os quais não usei. Serão reciclados ou doados. E menos ácaro para mim, menos um árvore cortada, mais uma pessoa que entre numa faculdade. Vai saber.

Adentrei, então, no que eu sabia que perderia mais tempo. Todos os cds. Agora com mp3 player não se dá mais tanto valor aos cds, mas minha coleção está lá, com cds riscados de tanto serem ouvidos e cds novinhos, depois da percepção que eram colecionáveis e importantes. Me lembrei de quando comprei a maioria deles, do ano não em que não comprei nenhum e só ganhei, do primeiro, do último, do que eu morro de vergonha, do qual não sei realmente o que está fazendo lá.

E cada vez que eu arrumo os cds os coloco em um ordem que acho mais condizente com o que estou sentindo no momento; já foram arrumados por ordem alfabética, por gênero, por ordem de aquisição e agora os coloquei na ordem dos que gosto mais. O que, naturalmente, não irá durar muito tempo e qualquer mudança de humor me fará procurar por mais tempo por aquele cd;

Por último respirei fundo e resolvi lidar com as coisas de mulher: maquiagem, creme, creme, mais creme, mais maquiagem, perfume. Joguei fora 75% de tudo o que estava ali, seja porque estava velho, seja porque estava quase no finalzinho, seja porque estava vencido. E deixei da melhor forma possível – o que sei que não durará uma semana.

Olhei o quarto e ele respirava assim como eu. E muito melhor. A desculpa foi uma rinite alérgica crítica, o motivo foi renovação. É interessante ver como nossa visão muda perante um objeto, como o valor que damos a ele varia de acordo com a época da vida, como algo que um dia foi tão importante agora é questionado sobre sua importância. Não tem mais valor, nunca teve ou teve o valor necessário quando necessário?

A pilha de coisas que saiu do meu quarto parecia tão morta, tão sem nexo que eu realmente me perguntava qual a função de todas aquelas coisas ali. Me ajudaram a crescer?

Foi quando vi no cantinho do quarto, bem ao lado de novo local da cama, uma cesta cheia de bichinhos de pelúcia. A função do bichinho de pelúcia é do momento, realmente, porque não há o que se fazer com ele depois. E por quê, então, tinham coelhos com 10 anos de idade ali?

Separei uma grande saco plástico, comecei a espirrar só de chegar perto e fui colocando um ao lado do outro na cama. A memória correu novamente, foi bem longe, voltou, falhou também; mas separei a grande maioria deles e os juntei no saco. Ficaram alguns. Não consegui desapegar.

E não eram bichinhos que ganhei de presente quando criança.

Mas ainda eram memórias fortes.

Quem sabe na próxima organização aquele coração, a vaca e o gato azul se vão. Por enquanto deixe que me façam espirrar. A rinite era só desculpa, mesmo.

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12.12.06

De passar despercebido

Estava a conversar com um grande amigo, certa noite em um bar, sobre as vicissitudes da vida e de como temos influência na vida de outras pessoas. E estas, por serem influenciadas, também possuem grandes efeitos nas nossas. A básica equação de ação e reação.

Contudo, muitas vezes vemos a ação progredir sem ver exatamente qual reação se formará disso. Nesta simbiose que concluímos que devemos passar despercebidos.

Entenda que passar despercebido não é deixar de existir, co-existir ou interagir com todo o ambiente que nos cerca, mas agir de forma que suas ações tomem lugar sem necessariamente (ou intencionalmente) chegar a outrem.

Viver a nossa vida sem que tenhamos que discuti-la, sem que tenhamos que nos provar, sem que tenhamos que explicar qualquer dos passos dados; e passos dados que sabemos terem sido feitos para caminhar pra frente.

São passos que influenciaram outras pessoas, que nos farão crescer, cair, perder e levantar de novo. Ou serão passos que levarão à perfeição, seja esta qual for. Mas, mais importante, são passos pessoais e que se pessoas tiverem que saber, saberão por motivos maiores. E se influenciarão. E por suas reações seremos influenciados.

Passar despercebido para aqueles que importam dificilmente acontece.

Mas passar despercebido pelos olhos de outrem, aquele que te vê, mas não te enxerga, é só mais um passo em direção ao seu caminho. E reações virão. Conte com elas.

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10.11.06

De ser

Paixões são irrefutáveis.

Elas surgem, maiores que nossa razão, sem querer hospedam-se na nossa mente, no nosso corpo e fazem de nossas mãos extensões de desejos; a necessidade de tocar, maior que qualquer razão, maior que qualquer questionamento além.

Seria plausível, para uma mente cética, questionar o princípio de tudo aquilo, seu começo e, exatamente, porque surgiu. A mim, basta saber que surgiu.

Creio que a questão maior é como lidar com a paixão. Ela se instala e não há meios de evitá-la: quando nota-se sua presença, ela já aconteceu. Prevenir, remediar, questionar, nada disso tem poder algum quando diante da paixão. Meros mortais que somos, ou assumimos ou engolimos.

Engolimos.

São poucos aqueles que não tem medo de se jogar no vazio, de se perder em idéias não concretas, de dar a cara pra bater e qualquer outra analogia que você possa estar a pensar agora.

E quando assumimos?

Assumimos a mudança, a infinita possibilidade de dor, a miríade de problemas que surgem exponencialmente, a certeza de que nosso passo não é qualquer mas é certeiro para uma oportunidade próxima. Orgulho de si mesmo, a convalescença da dúvida anterior, o fato dado e consumido.

O medo.

E o que nos rege senão o medo?

Paixões surgem e o medo é intrínseco.

De que seriam feitas paixões se não fosse o medo de perdê-las? Perdê-las, não as sentir, de virar o vácuo entre mente e coração.

Parece idiota, mas se o coração não bater mais forte, de que adianta bater?

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9.5.06

A Vida Parece Não Passar

Eu sempre fui uma pessoa muito impaciente. Nada me irrita mais que o fato do mundo nunca andar na mesma velocidade que eu.

Normalmente sou calma no trânsito. Ah, mas se vem um carro lerdo na minha frente quando eu estou na faixa da esquerda, eu fico histérica. As piores brigas que tive com meu pai, um cara tranqüilo e bonachão, foram geradas pelas minhas crises de chatice, porque ele dirige devagar demais.

Na vida pessoal não é muito diferente: há alguns anos, minha frase mais comum era “como eu queria ter 28 anos”. Não que eu fosse inocente a ponto de imaginar que tudo seria perfeito nessa idade, mas eu pensava que eu teria novos problemas, outros desafios; na época, o mundo girava e girava, mas os relacionamentos problemáticos e mal resolvidos não saiam do lugar. Tudo aquilo era infantil e cansativo... Eu realmente não agüentava mais. Aos 28, seriam outras crises, e pelo menos não haveria tanto tédio.

Ainda me faltam alguns anos para ter 28, mas os problemas já mudaram, ainda bem. Não que as coisas sejam mais fácil, pelo contrário, a tendência é piorar. Agora o que está mais certo sou eu.

Já recebi uma homenagem de um amigo, escritor fantástico, falando sobre essa minha mania de querer fazer o mundo girar no meu ritmo. Ele me fez pensar em como sempre andava em círculos, não chegava a lugar nenhum, mas só fazia ficar cansada.

E cansei mesmo. Cansei de ficar empurrando tudo e todos para que eu pudesse tentar ir um pouquinho mais rápido. Resolvi largar mão, sentar e aproveitar a vista. E não é que eu gostei?

Foi quando eu consegui ver as pequenas coisas girando a mil em torno de mim. Tudo rápido, zunindo, divertido, do jeito que eu gosto. As coisas lentas também estavam lá, e andavam na mesma velocidade que tinham quando eu gastava tanta força nisso.

A vida parece não passar, diz um amigo meu. Mas isso porque ela gira em ritmo próprio, e temos que ser espertos o suficiente para saber que não vamos mudar em nada o seu ritmo. Ela muda sozinha... Que fazer senão baixar a guarda, fechar os olhos e ouvir o conselho do Rush:

Breathe this moment a little bit longer
Make its sensation a little bit stronger

Breathe it.



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9.3.06

Despir-se

Resolvi deixar o cd que estava ouvindo no computador tocar e não olhar mais para sua tela. Me espreguicei no sofá e tentei abrir a revista que havia comprado antes de ir para o trabalho. O plástico estava extremamente difícil de ser aberto, como aquelas embalagens de balas japonesas e, mais que rapidamente, porque não tenho paciência para lidar com embalagens que tiram todo o prazer de rasgar, peguei uma caneta e fiz um pequeno buraco. Ainda foi difícil, mas consegui ler a revista.

Eu poderia continuar a falar de como as matérias me deixaram a refletir mas por mais que seja fã da revista, não foi exatamente ela em si que me deixou a refletir e sim o plástico.
Parecia que fazia anos que eu não abria uma embalagem com vontade. Não uma embalagem qualquer porque meu peso na balança indica que várias de bolachas e iogurte obtiveram sucesso na abertura e consumo, mas sim desembrulhar algo que você quer ver, sentir, olhar, fitar. Não penso em presentes pois estes são sempre bem vindos somente por serem frutos de uma lembrança de alguém em você. Penso em como é bom tirar o invólucro, rasgar o papel, furar o plástico que resiste em ceder e encontrar algo que se quer tanto.

O que está por debaixo da embalagem, dentro dela foi cuidadosamente embrulhado para que fosse aberto. Nada é coberto se não fosse para ser aberto. É uma meta, um objetivo que aquilo tem em si. Nada mais claro, mais óbvio e nítido que sair da casca e ser desfrutado. Questão se faz quando ou não se tem a vontade de ver o que há por debaixo da embalagem ou a decepção em encontrar o que se vê.

Eu já acho tão genial não saber o que se encontrar mas a vontade de descobrir superar tudo isso. O presente surpresa, a nota da prova, a reunião com o chefe, a conversa com o namorado. Qual a graça em fechar a caixa sem não ter tirado seu conteúdo pra fora? E por que deixar de abrir a embalagem correndo, rasgando tudo, como se não houvesse mais nada em volta só pra ver o que tem dentro? Eu somente guardo na minha coleção tudo aquilo que foi despido. A gente sempre pode embrulhar de novo mas a vontade de abri-lo de novo não será a mesma. Despir-me de todo o papel brilhante, os laços, o plástico resistente, isso sim é bom.

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