31.12.04

Fechando para balanço

Chega o fim de ano e todos começamos a pensar no que foi que fizemos de bom, coisas que aconteceram para nosso benefício ou malefício, basicamente, pensamos em nosso umbigo. Não vou contrariar essa regra mesmo com tantos fatos horríveis nesse fim de 2004.

Voltei da minha viagem familiar de fim de ano e posso dizer que família é como a batatinha que acompanha o hambúrguer: não tem como não pedir e se não vier você sente falta. Analogia besta? Talvez. Mas posso afirmar que as coisas ruins da família continuam as mesmas, em todos seus horríveis detalhes, porém, agora com uma visão de quem fica com os tios tomando cerveja, posso dizer que existe o lado bom. Limitemos isso ao carinho de alguns parentes e só. Ainda creio na máxima “parente é serpente”, mas alguns são somente umas cobrinhas.

Esse ano foi o ano em que perdi meu avô e como diz a outra escritora desse zine, a vida fica menos doce sem os avós. A minha com certeza ficou e ainda dói. A parte boa, digamos, foi me conhecer e saber como lido com a morte. Muito bem, obrigada. O que vem a calhar já que a minha idosa cachorrinha está fazendo hora extra por aqui.

Esse ano foi ano de bater a cara e colocar o pé no chão e descobrir que por mais que a Síndrome de Peter Pan acometa a todos nós, temos que passar por cima dela. Então, estou tentando virar gente grande, como diria meu priminho de quatro anos. Para ele eu já sou gente grande, mal sabe ele que queria mais era ficar jogando vídeo game com ele na sala.

Esse ano foi ano de redescobrir que amigos não ficam com a gente para sempre como queríamos acreditar. Mas ao realizar isso, amigos de outrora se tornam mais próximos e mais amigos. Inversamente proporcional ao tanto que perdemos, mais forte fica a amizade com alguns.

Esse ano foi ano de começar a ler muito mais, a se deliciar em passar horas em feiras de livros, em ir completando a estante com exemplares da área de estudo e outros nem tanto e de começar a escrever aqui. O fato desse fanzine nascer e já durar quase seis meses é de grande felicidade para mim e também para minha caríssima Adriana, co-autora aqui.

Esse ano foi ano de descobrir o que fazer e iniciar os movimentos para que sejam completados no ano que vem. E ano que vem é ano de ser feliz.


Feliz Ano Novo aos leitores do URGENTE e aos próximos que vierem nos acompanhar
.

|

21.12.04

Garantindo o refrão

Sempre gostei de escrever. Tenho até hoje cadernos meus de pseudo-poesias e redações de quando eu tinha doze anos – embora hoje eles só sirvam para me matar de vergonha, antes eram a válvula de escape de uma pré-adolescente com pré-angústias.

Eu gostaria de poder viver disso. Não sei se terei um dia qualidade suficiente ou mesmo demanda pelo meu trabalho a ponto de fazer disso minha principal atividade. Mas continuo tentando, e nessas até criei um e-zine com uma amiga, o Urgente, conhece?

A idéia do e-zine surgiu de uma resolução de ano novo feita em agosto: se realmente gosto de escrever, e quero fazer isso o resto da minha vida, é bom eu praticar. Vi que era preciso acabar com qualquer timidez ou preguiça e criar um hábito correto. Escrever, reler, revisar, arquivar, e deixar que leiam. Então surgiu o Urgente: uma iniciativa despretensiosa mas com meta de crescimento e dominação de 24 territórios a nossa escolha.

Queremos escrever toda semana e estamos quase perto dessa meta, quando não somos vencidas pela realidade ou pela nossa preguiça. Esse texto é uma tentativa de não naufragar a ela.

Escrever é vencer uma folha em branco. Requer observação do mundo e de si mesmo e muita atenção ao detalhe. Sempre que releio o que escrevo, quero mudar tudo. Como são textos menores, eu não fico me martirizando (muito) com o que não gosto.

Mas pior do que erros de concordância é sentar na frente do papel sem a coragem de dizer o que se pode dizer. Às vezes é preguiça ou falta de memória, mas geralmente é a falta do exercício constante de transformar em palavras o mundo ao nosso redor.

Hoje eu tento vencer essa angústia de me sentir vazia explicando-a para quem me lê. É um texto um pouco metafísico demais, contudo preciso disso para conseguir vencer essa folha em branco. Não posso deixar que ela fique muito forte contra mim. Se eu não escrever, não vou poder apagar, rabiscar e, quem sabe um dia, comover alguém com algo que eu tenha dito. Ou melhor, escrito.

Essa é a melhor das metas que um escritor pode ter.

|

7.12.04

A mudança

Crep-Crep. Crep-Crep. Assim fazia a fita que selava a caixa. “Será que é por isso que se chama fita crepe?” Crep-Crep. Crep-Crep.

Era a última. Na sala estavam jogadas suas malas e sacolas, sua vida naquele ano. Que agora caberia no seu carrinho. Um carro pequeno, “teria sido a vida também pequena?”

Ela gostava de mudar daquele apartamento. Era pequeno, sem armários, com um carpete estranho. Queria algo maior, ao menos mais arrumado. Espaço, precisava de espaço.

Ela queria mudar a sua vida. Estava cansada, exausta. Precisava dormir, ler, tinha uma necessidade súbita de poder ficar duas horas parada e isso não ser um problema. Queria tempo para desperdiçar, espaço para se espreguiçar.

Olhou para as malas. “Será que vão caber?” Tinha sido feliz lá. Gostava do seu quarto, sentiria saudades. Sempre tinha gente a mais em casa, sempre no seu quarto, mesmo quando ela não estava lá. Encantava-lhe essa impressão do aconchegante. Lá era mesmo gostoso, as camas confortáveis, acolhiam. Era um quarto de dormir bem.

Olhou pela janela. Era noite, estava sozinha. Não se sentira muito só naquela cidade. Às vezes sim. Sempre fora assim, em qualquer lugar. Este lhe dava todas as opções que queria, até as que nunca havia utilizado. “Tem tanto mundo nesse mundo.” Iria agora ver, sair da bolha.

Mas nesse dia se sentiu sozinha. No meio da sua mudança, encontrou-se um híbrido entre o que fora e o que seria. Nesse momento não era, só estava, esperava, mudava. “Não se é senão a transição.” Sozinha, sem alguém que fosse de quando ela era – porque não haveria como se ter alguém que fosse de quando ela será.

Parou, olhou. Resolveu carregar tudo. De manhã nunca havia motivação. “Havia alguma agora?” Às vezes o gelado se sobrepunha ao quente. Queria nada. Parar e não olhar. Ficar no meio termo. “Para que tanta caixa, tanta mala?” Tanta coisa, vida empacotada, um ano cabe só nisso. Podia ficar sempre com a vida assim, dentro da mala. “Para que tirar, dá um trabalho...” Estar como mala, parada, pesada, lenta. Tudo mais devagar...

Olhou de novo, levantou. Começou a levar as coisas para o carro. Resolvera mudar.

Às vezes, o quente se sobrepunha ao gelado.

|

3.12.04

Promessas

Por quê as pessoas precisam tanto de promessas de fim de ano? Por quê ao virar meia noite do ano recém nascido mentalizamos tudo aquilo que queremos que aconteça ao longo dos próximos 365 dias? Me pergunto isso porque questiono a mim mesma: isso leva a algum lugar ou é somente uma promessa besta, algo que é tido como tradição de ser feito nessa data em especial?

Tem aqueles que são mais filantrópicos, digamos assim, e pedem a paz mundial, a inexistência da fome, da guerra...e 99% fazem uma lista de objetivos que são descartados no primeiro minuto do ano que chegou. E assim se segue numa linha de raciocínio que chamarei de “A linha da dieta de segunda feira”. As pessoas têm aquela epifania de objetivos tão nobres (ou não) e cumprem a primeira meta: desejá-los. A segunda meta: fazê-los acontecer não acontece justamente pois vão prolongando pra depois, assim como aquela pessoa que precisa ou quer começar a dieta: “Ah, segunda feira eu começo.”

Parece que o ano novo é aquele banho de limpeza, aquela confissão na igreja, você tem a liberdade de começar tudo de novo. Mas isso não vai justamente contra fazer os pedidos? Pois, afinal, no ano que acabou de passar foram feitos outros pedidos em sua virada. Foram eles cumpridos? Foram eles ao menos executados? Ou simplesmente é mais fácil iniciar um novo ano cheio de pedidos que nunca serão cumpridos somente pela “tradição” de fazê-los?

Acho que banalizar tanto seus objetivos acaba por torná-los cada vez mais pobres. A cada ano que entra se fazem novos pedidos, promessas e não importa se são cumpridos, pois dentro de trezentos e poucos dias eles não existem mais. São substituídos pelo estouro dos rojões. São apenas promessas não cumpridas.

Eu não tenho nada a ver com pedido ou promessa de ninguém. As pessoas os fazem e são exclusivos problemas delas, mas penso que cultivar objetivos com a função de atingi-los, de tê-los como meta, é algo muito mais compensador. E nem que seja começar uma dieta, que ela se inicie na quarta feira porque, afinal, o que se quer não espera, não é?

|
Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com